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A metrópole não é pra quem gosta de carros


Você já se perguntou qual o sentido de estar a bordo do carro dos sonhos, se a sua velocidade média no trânsito mal atinge 5 quilômetros por hora? Já se arrependeu de ter optado pelo câmbio manual porque precisa pisar no pedal da embreagem milhares de vezes para engatar e desengatar a primeira marcha a cada cinco metros? Não sabe o que faz, agora que preparou o seu motor e ele foi reprovado na inspeção veicular?

Pois é. Cada vez mais, ter um automóvel no cotidiano se aproxima de algo para quem não gosta de carros. Mas temos alguma alternativa?

Transporte público vs. logística vs. conflito de classes

Digamos que todos os paulistanos - já que São Paulo representa o caso mais grave - resolvam deixar seus carros na garagem, adotando o transporte público de uma só vez. Em prol de um mundo mais verde, de maior interação social, em nome da sustentabilidade (palavra picareta usada por "marketeiros" para agregar valor à sua marca). Não precisa ser um gênio para adivinhar: o sistema, que já opera no limite, iria entrar em colapso.

Visão... paradisíaca, da estação Sé do metrô paulistano

Historicamente, o Brasil investiu em rodovias e avenidas que em poucas décadas se tornaram subdimensionadas para o fluxo, e deixou de lado (na verdade, nunca investiu com decência) o transporte ferroviário - seja para mercadorias ou passageiros. Para uma cidade do nosso tamanho, a malha de metrô paulista é uma piada que beira o ridículo. Agora, podemos remendar, fazer gambiarras... mas nunca solucionar.

E há mais um agravante, que é uma ferida polêmica: o estranhamento de classes econômicas. Com exceção aos centros comerciais, se você é um cidadão com algum poder aquisitivo, torna-se automaticamente algo alheio à maior parte dos passageiros. Estou mentindo, ou você é daqueles (ou conhece alguém) que esconde o relógio, celular, coloca a carteira no bolso da frente ou escolhe uma roupa mais simples, se vai utilizar transporte público? Laptop, iPads, que tal? É uma paranóia muito triste, alimentada pelos dois lados, que serve um preconceito mútuo e só piora o relacionamento entre classes econômicas distintas. Esse é um problema de difícil solução: exige estruturação econômica acompanhada de transformação cultural. Alguém imagina quantas décadas leva um processo desses?

As coisas boas que perdemos ao usar o carro

E sim, é legal não usar o carro. Deixamos de viver muitas coisas bacanas, de conhecer gente nova, lugares e caminhos desconhecidos. Já descobri ótimos restaurantes e bistrôs assim, de passagem - a pé. Dentro de um automóvel, tudo entre o ponto de saída e chegada vira um borrão momentâneo e repetitivo. E é pouco produtivo - se alguém está dirigindo, pouco pode fazer além de... dirigir. Como passageiro do metrô ou de um ônibus, pode-se estudar, trabalhar, enfim. Sem contar os benefícios cardiovasculares de uma caminhada ou pedalada.

...e com o trânsito de hoje, pasmem: eu, que não sou nenhum atleta, já fiz percursos de 10 quilômetros sobre uma bicicleta com mais rapidez que ao volante de um carro. Agora, pedalando onde? Sobre calçadas esburacadas ou entre veículos conduzidos por muitas pessoas atrasadas e mal humoradas. Perdi as contas de quantas vezes fui quase atropelado, principalmente por motos.

Daí, acabamos voltando para o automóvel - o calabouço que prende uma enorme fatia de estudantes e trabalhadores deste país. Nesse cenário geral, o que resta como sonho pra esses caras é um carro sem graça, econômico, automático, minúsculo e obediente para o uso diário. Automóvel como entretenimento, só aos finais de semana. E depende do horário.

É. O mundo do entusiasta automotivo está cada vez mais difícil. Combustível caríssimo, congestionamentos, motoristas pouco instruídos, motoboys "vida loca", inspeção veicular dificultando a vida dos donos de carros preparados. Onde iremos parar?

Fonte: Jalopnik, 16/10/2010

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