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Vá de ônibus, a pé ou bicicleta. Carro, não!

Trocar o conforto do carro particular para dividir espaço e itinerário com usuários dos coletivos foi, antes de tudo, um desafio ecológico para o técnico de radiologia Marcos Assis, de 27 anos. Ele e mais dois curitibanos participaram da experiência de mobilidade urbana, proposta pela Gazeta do Povo, para marcar o Dia Mundial Sem Carro, na próxima quarta-feira, dia 22 de setembro.

Assis mora no bairro Guabirotuba, mas trabalha no Batel e estuda no Centro da cidade. Motorista convicto, considerou a substituição do carro pelo ônibus uma forma de contribuir para o meio ambiente. Só não imaginava que cumprir a sua rotina de casa, trabalho e faculdade – ele é aluno de Engenharia de Produção na FAE – ficaria mais complicado ao dividir um meio de transporte com 2,2 milhões de usuários diários. Mal conhecia quais das 430 linhas que são disponíveis na cidade serviriam para cumprir seus itinerários diários.

Durante a semana em que deixou o carro na garagem, Assis observou problemas como o preço da tarifa e o desrespeito das pessoas mais jovens com os idosos, deficientes e gestantes. “Dependendo do trajeto, eu tinha de pegar dois ônibus. Desembolsava R$ 8,80 por dia”, conta. Depois de passar uma semana apertado, segurando em uma barra de ferro para não ser jogado com a força do ônibus, ele afirma que até poderia usar o transporte coletivo, mas ainda não foi convencido a trocar de modal. “Para pequenas distâncias o sistema funciona melhor, mas prefiro meu carro”, diz.

Para os especialistas em transporte urbano, a opinião de Assis faz sentido. O transporte coletivo de Curitiba, reconhecido, copiado e premiado no mundo inteiro, não é mais o mesmo há muito tempo. Desde meados de 1970, quando foram implantadas inovações como o sistema expresso, o eixo Norte-Sul, as primeiras linhas alimentadoras e seletivas e os ônibus biarticulados, o transporte e a infraestrutura não passaram por nenhuma transformação, a não ser pela construção da Linha Verde e por uma licitação para renovação dos contratos com as empresas prestadoras do serviço.

Na opinião de economista Lafaiete Santos Neves, professor de Mestrado em Organizações e Desenvolvimento da FAE e autor do livro Movimento Popular e Transporte Coletivo em Curitiba, desde a implantação do atual modelo, o transporte público em Curitiba estacionou. “A prefeitura, ao longo das gestões, preferiu investir em veículos leves. O resultado está aí: o trânsito caótico, congestionamentos fora de horários de pico. Curitiba não se preparou para implementar um transporte de massa. Não avançamos, não investimos no metrô. O sistema atual, além de perigoso, está sucateado”, afirma.

Segundo engenheiro civil João Carlos Cascaes, ex-diretor de Planejamento e Engenharia da Urbanização Curitiba S/A (Urbs), o sistema de ônibus foi ótimo até atingir o grau de saturação atual. “A superlotação é um pesadelo. Dentro dos ônibus não temos segurança, pois a forma de dirigir de muitos motoristas é violenta. Carecemos de um sistema complementar de grande capacidade, que integre os eixos”, diz.

Referência

Para o presidente da Urbs, Marcos Isfer, o transporte coletivo de Curitiba continua sendo referência. “É o sistema que será adotado pela maioria das cidades que serão sedes da Copa do Mundo de 2014, que vão construir ramais com canaletas exclusivas”, afirma.

Isfer garante que a superlotação só ocorre nos horário de pico. “O sistema trabalha na capacidade plena, com seis passageiros por metro quadrado, conforme a lei. A lotação nos horários de pico acontece em todo o mundo”, explica.

DIÁRIO DO DESAFIO

Marcos Assis, radiologista, 27 anos.

Sexta-feira, 10 de setembro

Uma hora a menos de sono para dar conta de cumprir o trajeto do dia, entre o Guabirotuba, Batel e o Centro da cidade, num total de 36 quilômetros, foi um dos pontos negativos destacados por Marcos Assis. Pouca gente dentro do ônibus e a tabela de horário normal, de dia de semana, compensaram o transtorno do início da manhã.

Sábado, 11 de setembro

Precisar de transporte coletivo aos fins de semana é um exercício de paciência para o usuário, principalmente os menos experientes. Por causa da tabela de horário diferente, Assis chegou atrasado no trabalho e nos compromissos que tinha agendado no período da tarde, para a faculdade.

Domingo, 12 de setembro

Assis não saiu de casa.

Segunda-feira, 13 de setembro

Mais confiante na experiência, Assis arrisca uma mudança de itinerário. O tempo de espera foi menor, mas o ônibus lotado e a hora a menos de sono ainda são desvantagens. No fim do dia, chegar em casa depois das 23 horas também pesou para desaprovar o modal.

Terça-feira, 14 de setembro

Novamente a superlotação no coletivo incomodou Assis. Mas o pior foram os flagrantes de desrespeito aos lugares preferenciais, com idosos em pé porque os bancos destinados a eles estavam ocupados por gente mais jovem.

Quarta-feira, 15 de setembro

Economizar com o estacionamento para fazer um exame médico foi o único ponto positivo do dia. O ônibus estava lotado logo de manhã. À tarde, a espera por dois coletivos tomou tempo demais, e o percurso foi quatro vezes mais demorado em relação ao que faz com o carro. Voltar para casa com torcedores fazendo baderna na saída do jogo também foi desagradável.

Quinta-feira, 16 de setembro

Nova mudança no itinerário economizou tempo e dinheiro. Assis não precisou esperar muito pelo transporte e ainda economizou o estacionamento na faculdade. Mas a lotação do ônibus quase o impediu de embarcar na linha que precisava para não chegar atrasado na faculdade. Acordar mais cedo e chegar em casa mais tarde ainda incomoda o usuário.

Conclusão

A semana pareceu mais longa do que o normal. Mas a conclusão de Assis é que distâncias maiores que 10 quilômetros são inviáveis com o transporte coletivo, pois além de caro, o tempo que se gasta no percurso pode ser usado para outras coisas, como lazer. Já em distâncias menores, esse modal pode ser eficiente. Para ser usário do transporte coletivo, é preciso conhecer o serviço: itinerário e horários. Um livro ou uma revista podem ajudar a aproveitar melhor o tempo dentro do ônibus. Mas a experiência não convenceu Assis. Ele não trocaria o carro pelo ônibus.

Fonte: Gazeta do Povo, 19/09/2010

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