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Cartas de Buenos Aires: Melhor em bici

de Gisele Teixeira

Para os que querem aprender palavrões em espanhol, uma sugestão: entrar em um táxi e defender as ciclovias.

Os motoristas portenhos andam caprichando no vocabulário quando o tema é o programa “Mejor em Bici”, do governo da cidade, que instalou cerca de 40 quilômetros de ciclovias por Buenos Aires.

Eles odeiam essa iniciativa! E vão odiar ainda mais quando as ciclovias chegarem a 120 quilômetros, no final do próximo ano!

Os taxistas reclamam que as ciclovias “tiraram” o espaço dos carros e que pouca gente as usa. E é verdade. Trocar o carro pela bicicleta é uma mudança de estilo de vida. Isso demanda uma decisão pessoal muito forte e um período de adaptação. Leva tempo.

As ciclovias são um passo importante nesse processo, especialmente em uma cidade como a capital argentina, praticamente toda plana.

Paris, Nova Iorque, Barcelona e Bogotá, para dar um exemplo latino americano, adotaram com sucesso a bicicleta como aliada estratégica para aliviar o problema do trânsito. Porque aqui não pode dar certo também?

Esta semana o governo começa também o programa de aluguel gratuito de bicicletas.
Inicialmente serão ofertadas 100 bicis, distribuídas em três estações: na Faculdade de Direito, na Recoleta; em Retiro e na Praça da Aduana. A promessa é chegar a 12 estações nos próximos três meses e a 500 bicicletas. Em Paris são mais de 20 mil!

Há outras ações de estímulo desse transporte em Buenos Aires, como o projeto “Al trabajo, mejor em bici”, que já envolve 27 empresas, entre elas Google, Telefônica, Intel, Coca-Cola e YPF. Elas subsidiam parte do valor das bicicletas dos funcionários e facilitam seu uso, instalando estacionamentos, duchas e vestuários nos locais de trabalho.

Falta muita coisa, no entanto, como campanhas de educação. Andar pela ciclovia diariamente é uma guerra. Dá de tudo! Mamães com carros de bebes, passeadores de cães, motoqueiros. Sem falar nos carros estacionados e nos contêineres de lixo que são colocados nesses locais. Mas é somente tomando posse do espaço que a situação pode mudar.

Por isso, um domingo por mês há “bicicleteada” de conscientização pela cidade. A última reuniu mais de três mil pessoas.

Desde que vim morar aqui não tenho carro. Inicialmente, usava a bicicleta somente nos finais de semana, e o resto dos dias mesclava ônibus, metro e taxi. Em maio passado investi em capacete, luzes, cestinho e a magrela passou a ser o transporte oficial aqui de casa. Menos tarde da noite, claro.

Sei que esse tipo de transporte não é a solução para os problemas de transito das grandes cidades, nem a saída adequada para todas as pessoas. Mas pode ser para muita gente. Para mim foi uma libertação.

Esses dias, enquanto pedalava por meio dos jacarandás na Recoleta, com um ventinho de primavera na cara, vi um senhor obeso, fumando um cigarro dentro do carro, no sol, trancado num engarrafamento.

Ele era o símbolo de tudo o que não quero mais para mim nem para o planeta.

Fonte: O Globo, 30/11/2010

Projetos de Incentivo ao Uso da Bicicleta aqui.

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